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sexta-feira, 4 de julho de 2008

Capítulo VIII

Jô olhou o relógio assim que entrou na sala de estar de sua casa. “Será que ela já chegou a casa? Onde será que está?”, pensou angustiada. Sentiu um toque em suas costas e virou-se imediatamente para Júnior que estava atrás de si.
- Jú é melhor ligar pra sua casa. Às vezes Lisa ainda não chegou.
- Hei Jô, relaxa! Lisa não ia pra casa esqueceu? Ia encontrar aquele rapaz... Qual o nome dele?
- FRED! - Ela respondeu quase rosnando.
- Nossa! - Júnior arregalou os olhos tão parecidos com os de Lisa – Dá pra ver o quanto gosta dele. Mas sabe, acho legal a Lisa namorar. Tava na hora, ela é muito gatinha e muito gente boa pra ficar só. Apesar de que hoje ela tava bem estranha. Não quer mesmo falar porque vocês brigaram?
Júnior insistira todo o caminho para saber o motivo da briga das duas. Mas como explicar se nem mesmo Jô conseguia entender bem o que acontecera? Aliás, a briga agora era o de menos. Estava preocupada era com onde Lisa estava e com quem! “Ai que ódio”, pensou, “Ai se ela beijar ele, eu me mato.” Não conseguia imaginar Lisa beijando ninguém. Ignorou abertamente as palavras de Júnior e seguiu para o quarto da filha.
- Olha Jú, ela tá dormindo!- Ergueu as mãos delicadamente e ajeitou melhor a coberta por sobre a filha. Júnior a observou e ficou surpreso com a mudança de expressão no rosto dela. De angustiado passou imediatamente para amoroso, terno. “Ahh queria tanto que olhasse pra mim assim também”, pensou sonhador.
- Jô é maravilhoso como você se adaptou logo ao papel de mãe. - Disse baixinho, quase ao ouvido dela. Jô teve um leve sobressalto ao ouvi-lo, mas respondeu também baixinho.
- Nem eu acredito sabe. Nunca me imaginei assim, sei lá. É muito estranho. Mas não consigo imaginar mais minha vida sem ela. Fez um gesto para que ele a acompanhasse até a porta, que deixou semiaberta, e deixou apenas uma luz fraquinha acesa no quarto. Os dois saíram para o corredor e deram de encontro com Lúcia.
- Jô? Júnior? Olá rapaz, como está? - Parecia surpresa ao vê-lo.
- Olá Lúcia. É também um prazer vê-la! - disse dando-lhe dois beijinhos no rosto. Junior não conseguia jamais chamá-la de senhora, pois era muito nova e bonita. Lúcia, ao mesmo tempo em que passava um ar maduro, mantinha uma postura bem juvenil. Ninguém a imaginaria avó.
- Mãe, a Mariana deu trabalho?
- Nenhum filha, foi um doce. Aliás, ela é um doce, nunca vi uma criança que chora tão pouco. Com certeza não puxou a mãe. - disse rindo
- Ah, sua sem graça!- Jô olhou encabulada para Júnior.
- Mas, cadê Lisa? Vocês não saíram juntas? - Lúcia olhava interrogativamente para a filha, estranhando Lisa não estar com ela e sim Júnior.
- Ela tinha um compromisso e teve que sair mais cedo. - foi Junior quem respondeu ao notar que Jô nada disse à mãe - Logo deve estar em casa.
- Ah sim!? Bem... - Lúcia olhou pensativa para os dois – mas ainda assim chegaram cedo, ainda não são 21h. Querem que eu prepare um lanche?
Jô olhou surpresa para a mãe. Entendera claramente o olhar dela. Será que imaginava que ela e Júnior estavam de... paquera? Olhou para o irmão da amiga e entendeu bem o porquê da ideia de Lúcia. O rapaz se posicionara por trás dela e tocava possessivamente sua cintura, mesmo que bem de leve. “Só me faltava essa”, afastou-se não muito delicadamente do rapaz que a olhou um tanto decepcionado.
- Lúcia vou aceitar sim estou com muita fome mesmo. Não comemos nada no shopping. - Júnior respondeu antes de Jô ter qualquer oportunidade de dizer não. Jô o olhou séria. Não era mulher de deixar o que a incomoda para depois, mas este era Junior, o seu irmão postiço. Irmão... “Aff, pensou em desespero ao notar que ele estava se aproveitando de todas as oportunidades para estar com ela a sós.
- Isso, mãe! Mas prepare para três, Já que está em casa é claro que não querermos que fique só, néeee!!!! - E olhou fixo para a mãe, olhos meio arregalados. A mãe só não entenderia seu sinal se não quisesse.
- Filha – a mãe também a olhava fixo - Acho que você tem assuntos a tratar com Júnior. Além disso, estou vendo um filme. Pensando bem, vou voltar à televisão. – Se virou para o rapaz – Júnior você é de casa, podem ir os dois para a cozinha e fazer algo para comerem. - Virou-se e saiu em direção ao quarto. Jô a observou caminhar pelo corredor em direção ao quarto, “perfeito, hoje é o dia dos foras e das situações constrangedoras”. Não acredito que estou nessa situação!” Virou-se lentamente para Júnior que a olhava, agora sério.
- Jô, você percebeu, né?
- Percebi o quê? - Fez-se de desentendida
- Jô, precisamos conversar, - Júnior estava nervoso. Ela podia perceber que pequenas gotas de suor surgiam acima dos lábios do rapaz. “Ai, Nossa Senhora Desatadora dos Nós!” Rezava mentalmente, “juro que não assalto mais a geladeira à noite, que me tornarei a melhor aluna da sala, que vou à igreja aos domingos, mas, por favor, não o faz dizer o que estou pensando que vai dizer”.
- Jô... sei que não é cega, que já há algum tempo nota que eu, bem... Eu... eu tô a fim de você! – ele tomou coragem e falou tudo de supetão, olhando-a entre ansioso e apaixonado. “Perdeu a promessa, Atadora de nós!!” Gritou mentalmente Jô que colocou as mãos na cabeça e começou a andar pela sala, sem encarar o rapaz.
- Sanduíches. Quero sanduíche!- Disse repentinamente, indo rápido à cozinha.
- Jô sei que você não está surpresa! - ele falou a seguindo de perto - Olha a gente sempre combinou. Lembra bem o passado! Sempre tivemos assunto e eu não me importo com Mariana, ao contrário, adoro ela. E meus pais te adoram. Você ainda não percebeu, mas a gente se gosta. É só me dar uma chance. - disse disparadamente, sem respirar. Observava Jô abrindo a geladeira, agitada, e procurando, feito cega, algo lá dentro. Aproximou-se por trás e quando ela se virou a segurou nos braços. Jô arregalou os olhos.
- Ju... Junior, isso não vai dar certo. Foi interrompida pelos lábios do rapaz que desceram sobre os seus. Júnior a beijou quase em desespero e ela se sentiu sufocar na angústia contida naquele beijo. Ele a abraçou tão forte que ela mal conseguia respirar e, quando abriu a boca em busca de ar ele aproveitou e invadiu sua boca com a língua. Jô sentiu um calor gostoso com o beijo, mas, uns segundos depois, se lembrou de Lisa e começa a se debater. Sentiu que o rapaz estava descontrolado e começou a socá-lo com as mãos. Finalmente se libertou, quase caindo dentro da geladeira.
- PIROUUUU? Júnior, você enlouqueceu?? Cara tu é meu irmão!! Meu Deus meu irmão me beijou! – começou, desesperadamente, a esfregar a boca. Júnior a olhou magoado. Estava cheio de desejo e angústia.
- Não sou seu irmão, Joyce. Não se iluda. Olho você como mulher e não como irmã. E você também não me vê como irmão. Você tava correspondendo o beijo. Jô o olhou assustada, depois o empurrou forte com as mãos. Fechou a geladeira e caminhou com passos duros para a sala. Virou-se para o rapaz, respirando fundo repetidamente, em busca de tranquilidade para falar. - Eu o vejo como irmão sim, Jú. Para com isso. Não quero magoar você. E se tratei você diferente é porque você é como Li, parece com ela. Você passa paz, tranquilidade, me deixa à vontade.
- Não é verdade Jô - Júnior não queria acreditar que as coisas estavam seguindo um rumo que ele não queria, não aceitava – você gostou se parou é porque tem essa ideia boba que sou seu irmão. Sai dessa, nem crescemos juntos assim.
- Júnior, já disse que não tem nada a ver! Pô, cara, não estraga a nossa amizade, não estraga meu contato com vocês – ela pediu em desespero. Júnior a olhou sério e angustiado. Por um momento ela sentiu seu coração bater, um batido diferente, desejoso, prazeroso com o sentimento que via nos olhos do rapaz, mas logo depois a angústia voltou a imperar nele. - Ju, eu... eu adoro você, mas... não como homem, não como namorado. Desculpe, não quero magoá-lo... Não dá. Eu nunca te dei esperanças, nunca. Jamais brincaria com isso. Por favor, vamos voltar o tempo e esquecer essa bobagem e...
- Bobagem??? Bobagem?? - Ele a interrompeu raivoso – Pode ser para você, mas respeite o que eu sinto. E não, não volto o tempo porque isso não mudará o que sinto. – A olhava magoado – Ok Jô, se é o que quer não falo mais disso. Mas saiba uma coisa. Você está perdendo, entendeu! E pode dizer sempre o contrário, mas você quis sim, por um momento você gostou de estar comigo. A partir de hoje caio na real e vou fazer exatamente isso. Esquecer. Continue sim indo lá em casa, mas nunca, nunca me veja como irmão. Porque não sou, entendeu! Não sou!! - Júnior virou-se para a porta de saída, abriu-a e sai sem lhe deixar a mínima oportunidade de dizer nada.
Jô se jogou no sofá e cobriu o rosto com as mãos. Começou a chorar e então sentiu braços a seu redor. Ergueu o rosto para sua mãe que a olhava compreensiva, estreitando o abraço. Jô então a enlaçou também, caindo em prantos. Não foi preciso dizer nada. Não existem palavras para explicar a mágoa que às vezes causamos em pessoas que nos são tão importantes. Mesmo que às vezes seja preciso. Após um tempo, ambas escutaram um choro baixinho. Levantaram-se e, de mãos dadas, caminharam juntas para o quarto de Mariana. Jô segurou a filha nos braços e a ninou, encostando o rostinho no seu. Olhava para mãe, que lhe oferecia um olhar doce, acompanhado de um sorriso suave. Retribuiu tristemente o sorriso da mãe, que a enlaçou num abraço triplo, repleto de amor. Elas não estavam sós.
Júnior chegou em casa angustiado.
- Mãe, Lisa chegou? - A mãe o olhou do sofá, estava assistindo novela.
- Sim Júnior, está no quarto. Aconteceu alguma coisa? Ela chegou bem triste. - Mas o filho não a escutava, estava se encaminhando ao corredor que levava aos quartos.

 “Todos os dias Deus nos dá um momento em que é possível mudar tudo que nos deixa infelizes. O instante mágico é o momento em que um "sim" ou um "não" pode mudar toda a nossa existência”.

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