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terça-feira, 14 de setembro de 2010

Capítulo IX

Mariana passa as mãos sobre o pescoço sentindo uma sensação de sufocamento.
'Deus será que foi uma boa ideia?'
Observa as pessoas que caminham pelo Pátio Savassi, um shopping da zona sul de BH, cheias de compras, a conversar alegremente. Ansiosa, busca entre elas, alguém que, no mínimo, se pareceria com a descrição que recebera no telefone. Nada... será que levaria um bolo? Também, onde estava com a cabeça quando resolvera empreender tal busca? Suspira tensa e baixa a cabeça, os pensamentos voando longe. Nem mesmo a Lisa contara o que pretendia fazer. Ela não aprovaria. Diria que, antes de tudo, deveria conversar com a mãe, a avó, o cachorro... isso claro se tivesse um.
Mas, sinceramente, as vezes cansava de ser tão certinha. Tinha vontade de jogar tudo para o alto e fazer tudo que todos consideram absurdo, errado, impensável. Queria ter menos senso de responsabilidade... queria perder a sensação de predestinação, que viera para a mulher que a queria como amiga! Faz uma cara, como a imitar um mímico, ironizando tal afirmação. Queria! Sei! Até ela, que tinha pouca experiência em relacionamentos, percebia que Lisa a via como tudo, menos amiga! Mas não! Lá estava ela, sempre perto, a amiguinha! Não percebe que as pessoas a observavam e riam de suas caretas.
Suspira. Na verdade adorava conversar, ser amiga de Lisa. Mas queria mais, muito mais. Queria ser o amor de Lisa, mostrar que podia faze-la feliz... até mais que Luiza. Porque ela viera para ela! Tinha certeza disso. Bate a mão sobre o joelho. Algo tem que mudar!
Houve passos se aproximando e ergue o olhar nervosa.
O homem para a sua frente. Alto, loiro com um sorriso simpático. Os dois se encaram. O homem arregala os belos verdes, iguais aos de Mariana.
- Mariana?
Ela está muda... não consegue tirar os olhos do exemplar masculino a sua frente. Não parecia o cafajeste que Lisa descrevera. Ao contrário.
-Er... Daniel?
O homem a ergue em um abraço caloroso.
- Meu Deus! Mas que mulher linda você é!

Lisa procura as chaves do carro dentro da bolsa. Suspira impaciente ao deixa-las cair no chão.
- Ei Lisa.
Gritando de susto, olha para trás. Joyce. Suspira impaciente, mas antes de colocar em palavras seu desagrado pelo susto, repara a expressão vazia da outra.
- Jô? Você está bem?
- Levando. Surpresa te ver aqui.
- Vim fazer umas compras que minha mãe pediu.
- Sei... decidiu mesmo morar com seus pais?
- Sim... não vejo porque ter um cantinho meu... não neste momento. Estou carente da pessoa deles. E eles adoraram a ideia de me ter por perto.
- Legal. Eu... - Passa a mão nos cabelos – Podemos conversar um pouco?
Lisa a olha preocupada.
- Claro. Só me deixe guardar as compras.

Joyce suspira e dá um gole no café a sua frente.
- Pera Jô... vocês terminaram?
- Sim... eu... Bom Lisa, achamos que era melhor nos afastarmos.
- Mesmo? Parecia tão cômoda a situação para vocês. Ju parecia confortável em ser a outra de sua vida.
Joyce a olha um pouco revoltada.
- Pode ser, mas não segurei a onda de saber que você e ela foram amantes.
Lisa a olha tranquila.
- Hum... mas isso é passado. Ela mesmo disse, quando nos encontramos no shopping, ser minha ex lembra?
- Na verdade não. Minha mente não assimilou tal dado. É uma merda, em uma cidade do tamanho de BH, me envolver justo com sua ex amante.
- Jô, é por isso todo este nervo?
- Não segurei a onda tá legal! Fico imaginando ela me comparar a você, essas coisas.
Lisa ri alto.
- Que isso Jô. Tem anos luz que estive com Juliana. Ela, com certeza, teve outras depois de mim.
- Tá, pode ser, mas nenhuma outra foi minha amiga e muito menos minha amante.
- Fomos namoradas Joyce, não amantes – Lisa a encara agora séria. - Não diminua o que tivemos.
- Agora não quer que eu diminua, né. Pois foi você que nos classificou assim.
- Desde quando? O fato de não querer de volta, não significa que menosprezo nosso passado.
- Contanto que ele fique bem lá atrás!
- Isso mesmo Jô. Que ele fique no passado que é o lugar dele!
- Então, por que merda você sempre olha meus peitos , minhas pernas, minha bunda?
- Que isso Jô!
- Que isso! Não tente disfarçar. Já peguei você olhando várias vezes!
- Olha Jô. Toda vez que nos encontramos, você fica se insinuando para mim. Se olho, é porque você faz questão de se exibir!
- Grande desculpa – Joyce aplaude Lisa. E depois a olha nervosa. - Se você olha é porque deu vontade. Mas nunca vai assumir isso!
Lisa esfrega a testa nervosa.
- Jô, preste atenção. Eu sou lésbica. E admiro mesmo, quando vejo uma mulher bonita. Adoro peito, bunda, a merda a quatro. Mas isso não significa que tenho vontade de ir em frente.
Joyce sente a raiva borbulhar dentro de si.
- Você antes não era tão superficial Lisa. Luiza, a Índia que você adora exaltar, parece que não foram suficientes para vencer sua promiscuidade, sua sem vergonhice.
Lisa abre a boca em choque.
- Acha que não me lembro? Você comia cada mulher da esquina. Bastava te darem um sinal e você caia em cima! E Juliana foi uma delas!
- Cala a boca Joyce! - Lisa ergue o corpo ameaçadora em direção a Joyce. - Nunca mais... nunca mais cite o nome de Luiza, diminuindo o valor dela em minha vida. Ela era uma mulher que você jamais será. Foi ela que me trouxe de volta o respeito a mim mesmo, que valorizou o sentimento que você menosprezou e jogou fora!
- Eu nunca te desmereci!
- Não!? Você me colocou em segundo plano, quando eu te dedicava o amor mais puro que era capaz de dedicar a alguém. Você me menosprezou, depois me ridicularizou pelas minhas escolhas... casou, constituiu família e passou a me hostilizar e evitar como se tivesse lepra!
- Lisa! Que porra! Eu era mãe solteira! Me apontavam na rua como a adolescente que adorava dar. Fui engravidada, abandonada, depois apontada como vagabunda. Queria o que? Que me regozijasse por ser apontada também como sapata?
- Eu fui apontada como sapata Joyce.
- Perfeito! Mas seria eu que carregaria todas as mazelas que a sociedade condena.
- Ah Joyce... isso não é desculpa. Eu acreditava em nós. Faria tudo por você.
- Eu era uma adolescente apavorada Lisa!!! Enquanto seus pais te apoiavam, minha mãe me pressionava a encontrar um homem! Alguém que apagaria meu passado manchado e me daria uma vida direita!
- Sua mãe Jô? Mãe ama. Sua mãe te ama. Ela poderia ate ir contra, mas depois aceitaria. Realmente acha que era sua mãe que queria esta ' vida direita'? - Faz um sinal de fecha aspas com os dedos – A verdade é que você queria casar, queria um homem. A verdade é que eu não te satisfazia o suficiente. Queria mais! Você sempre quer mais!!
- E você estava dentro de mim para saber? Eu quase morri quando me abandonou! Você me deixou!
-E você não foi atrás!!!
Finalmente Lisa grita toda sua revolta, sua magoa por Joyce ter desistido delas. Os olhos cor de âmbar mostram toda a raiva e magoa que ela, por tanto tempo, acreditara estar enterradas.
- Você me deixou ir... - Volta a falar, agora com a voz triste – E fui decidida a nunca mais olhar para trás. E também a nunca mais sofrer de novo. Amar de novo. Sim, dei pra meia BH, comi meio BH. Era livre. Era infeliz. O que fiz não foi certo, mas eu estava machucada. E machuquei pessoas que não mereciam também. - Olha a morena sentindo um vazio no peito, uma tristeza inexplicável.
- Não tenho orgulho desse passado Joyce. E nenhuma vontade de voltar a ele. Luiza foi minha redenção. Foi meu anjo. Quem me trouxe de volta a alegria. Me ensinou o verdadeiro amor. Aquele que você não desiste, luta, vive, investe com a certeza de desejar, mais que tudo na vida, que o outro seja feliz. Mesmo que longe de você. - O olhar se entristece ao sentir a antiga dor de não ter mais Lu em sua vida.
Joyce engole em seco. Ela desistira de Lisa. Ela desistira desse amor.
- Lisa... eu, não estava pronta para tudo que queria. - Os olhos se enchem de lágrimas. - Eu só queria ser aceita... só isso.
- Aceita por quem Jô? Pela sociedade que te esculachou? Que valores são esses?
- Os valores que nos impõem, Lisa. Não ser apontada na rua, não ser motivo de escárnio dos outros.
- Falsidade, Jô, pura falsidade. A verdade Jô, é que você escolheu viver algo falso, ilusório, a enfrentar o mundo comigo.
Joyce dá um sorriso irônico.
- Éramos crianças Lisa.
Lisa a olha com pena.
- Não éramos. Mas ...se quer pensar assim... – Estreita os olhos – Jô... se pensa assim me diz... e agora? Somos adultas. E olha para você. Uma mulher infeliz no casamento, com uma amante para satisfazer a sede momentânea de um amor que fez ser proibido. Valeu a pena?
- Você se assume como meu amor perdido Lisa?
- Eu me assumo como aquela que você rejeitou, por ser aquilo que você menospreza também ser. Lésbica.
- Não sou lésbica. Também gosto de homem.
Lisa se ergue da mesa já impaciente.
- Então pronto Joyce, está resolvido. Vá lá dar a seu marido. Volte a sua vida medíocre e tente fazer alguém no mínimo feliz. Pare de se insinuar para mim, deixe Juliana seguir seu caminho e tente ser mais sincera com as pessoas a seu redor. Comece a ser gente Jô.
- Você nunca tentou me entender né, Lisa. Nunca tentou. Nunca percebeu que nem sempre as pessoas conseguem viver dentro de seus altos padrões de exigências.
- Jô... olha, pode ser. Mas o que tenho certeza é que, se você não parar de tentar reviver um passado que só me trouxe sofrimento, parar de se insinuar a mim, não teremos nada.
- Você nunca aceitará que me deseja né Lisa? Né Lisa!!
- Jô – O olhar de Lisa brilhava – Entenda de uma vez. Poderíamos até transar de novo, trepar, viver esta luxuria que tanto aprecia. Mas e depois? E depois Jô? Eu ia te odiar. Porque nada ia mudar. - Lisa respira fundo - Jô... eu não preciso de sexo, eu preciso de amor. Entenda de uma vez. Você me atrai sim, mas muitas me atraem. E nem por isso sinto necessidade de 'mostrar o pinto' e comê-las.
- Que lindo seu vocabulário! Olha Lisa, eu não quero seu 'pinto'. Quero a gente de volta só isso.
Lisa cruza os braços em proteção. Seu coração sangrava pela amiga do passado e lamentava pelos caminhos escolhidos pela mulher que um dia fora a pessoa mais importante de sua vida.
- Abriria mão de tudo, por isso Jô?
Joyce a olha arrasada.
- Você sempre pede demais Lisa.
- E você sempre dá de menos Jô.
Segura a mão da morena
- Jô, eu adoro você por tudo que foi em minha vida. Mas não respeito suas escolhas, não admiro sua postura. Como sua amiga, estou aqui para estar a seu lado, sempre que precisar. Mas como mulher quero distancia.
Joyce deixa cair uma lágrima.
- Mesmo se eu mudasse?
- Você quer mudar Jô?
- Lisa...
- Jô, lamento por você e Juliana. Lamento mesmo. Ela é uma pessoa boa. Mas acho que esta na hora de você rever seus valores. - Respira fundo - Olha, esta conversa foi por caminhos indesejados. Mas eu gostei. Gostei, porque pude colocar para fora tudo que guardei tantas anos. Me desculpe a agressividade.
Joyce põe a outra mão por cima da de Lisa, que ainda segurava a sua.
- Queria que tudo tivesse sido diferente.
- Jô... - Lisa balança a cabeça triste – Amigas?
Joyce ergue os belos olhos negros.
- Estou acostumada a perder Lisa. Mas não quero perder também sua amizade. É a única coisa boa que consegui resgatar na minha vida. - Dá um sorriso triste.
- Amigas.

- Mariana... - O homem segura suas mãos. - Qualquer homem teria orgulho de ser seu pai.
- Sim, mas... não você?
- Eu também filha. - Daniel a olha carinhoso. - Eu não fui um bom homem para sua mãe. Gostaria de poder pôr a desculpa na adolescência, mas seria te enganar. Eu não prestava.
- Por que nunca me procurou?
- Um pouco depois que sua mãe anunciou a gravidez, meus pais deram um jeito de sumir comigo. Fui mandado para o exterior, morar com um irmão de meu pai. Acabou as regalias, as diversões. Diferente de meus pais, era um homem exigente, conservador. Amadureci a força. Acabei por fazer minha vida por lá. Estudei, formei. Sabe como é.
- Na verdade não sei. Mas isso não é desculpa para não ter me procurado.
Daniel a olha por isso da armação dos óculos.
- Mariana... quando ainda era criança, eu a procurei. Voltei ao Brasil, voltei a me dar bem com meus pais. Comecei a trabalhar, a tentar reparar meus erros do passado. E olha que não foram poucos. Um pouco depois, entrei em contato com seus pais.
A jovem mulher arregala os olhos surpresa.
- Mas...
- Mas eles não permitiram que me aproximasse de você. O marido de Joyce foi claro em dizer que agora você tinha um pai. Um pai que a queria, a amava.
Mariana sente o coração abrandar. Mesmo não concordando com a atitude do padrasto, era bom saber que ele lutara por ela, que a amava.
- Nunca soube disso.
- Nos sempre pagamos pelos erros do passado filha. Por mais que lutemos para sermos melhores, nem tudo tem conserto. Eu... fiquei surpreso em receber seu telefonema. Como me achou?
- Não foi difícil. Busquei o colégio que estudaram, fiz umas pesquisas e voilá.
Daniel sorri travesso. Mariana percebe que seu sorriso se parecia com o dele.
- Impulsiva como sua mãe?
- Tento não ser.
- Me fale de você...
A conversa rola solta entre os dois. Daniel era um homem agradável, bem diferente do adolescente sem limites que fora.
Mariana olha o relógio preocupada.
-Tenho que ir. Nem percebi as horas passarem.
Daniel se levanta.
- Eu... vamos nos ver novamente? Não quero impor minha presença a você, filha.
- Eu... não sei. Quer dizer, não contei a ninguém que vinha te conhecer … eu... você me daria um tempo?
Daniel a olha compreensivo.
- Todo o tempo do mundo. Obrigado por me dar a chance de conhecer a mulher maravilhosa que minha filha se tornou.

'Uma semana. Uma semana e nada!'
Lisa observa a bela vista. Seu pai tinha razão de adorar ficar no sitio. A paz era imensa. Pena que não combinava com seu interior.
'Uma semana e nada... Mari desapareceu... ' Suspira e apoia a cabeça nas mãos sobre o joelho.
Ouve um chamado e olha para o varandão. O pai lhe gesticulava frenético.
- Tô indo, calma.
Se levanta tranquilamente da toalha sobre o chão e caminha em direção ao pai.
- Diz, seu Marcos.
- Seu irmão esta vindo pra cá com a família, Lisa. Sua mãe vai aproveitar a carona.
- Beleza, uai.
- Você pode me ajudar a arrumar as coisas? Pensei em fazer um churrasquinho. Parece que virão mais algumas pessoas.
- Churrasco? Hum... que chique. Claro que ajudo. Que quer que eu faça?
- Prepara tudo... atiça a churrasqueira. Vou sair e comprar a cerveja e as carnes.
- E queijo, pai. Sabe que não como carne.
- E queijo. - Ri divertido. - Acha mesmo que ia esquecer?
- Não só acho, como tenho a certeza.
Coloca uma sainha curta sobre a calcinha do biquíni e começa a arrumar a área da churrasqueira. Busca os espetos, prepara o carvão. Observa depois o serviço e sorri satisfeita. 'Feito'. Olha a piscina convidativa e, sem pensar muito, tira a saia e dá um mergulho. Fica nadando por longos minutos até começar a boiar. 'Que delícia. Quem será que vem para o churrasco?'

- Carlos, e por que você não quer ir? Vai ser muito bom ir ao sitio. Está um calor insuportável.
- Jô, eu já disse que não vou. Não quero ser sociável com pessoas que não tenho a mínima afinidade.
- Que isso! Você sempre se deu bem com Marcos e Paula! Junior então! Vocês sempre se deram bem!
- E quem disse que falo deles?
Joyce o olha surpresa.
- Fala por acaso de Lisa?
- E por que tanta surpresa Jô? Alias, a surpresa devia ser minha, já que, a poucos anos, o nome dela era até mesmo proibido nesta casa.
- Ave Cristo! - Jô levanta as mãos num gesto de impaciência.- As pessoas mudam Carlos, procuram corrigir erros. Não devia jamais ter me afastado de Lisa por conta de suas escolhas.
- Não achei erro nenhum nisso. O erro ocorre agora.
- Mesmo? Estranho você me dizer isso. Afinal, nos mesmos poucos anos, era você que babava na namorada de Lisa. Ou acha que sou cega?
Carlos se levanta enfurecido.
- Você me respeita Jô. Achei mesmo um desperdício uma mulher linda como aquela ser sapatão. Mas fazer o que! Deus lhe deu o castigo merecido.
Joyce o olha chocada.
- Meu Deus Carlos! Onde aprendeu a ser tão preconceituoso assim? Nem parece mais o homem que me casei!!
- E você por acaso é a mesma mulher que casei Jô? Sabe – Passa as mãos sobre os cabelos que começam a ficar ralos – Você, na verdade, já não tem nada daquela mulher que casei. As vezes sinto que fui enganado. Que você representou, todo esse tempo, o papel de mulher casada. Mas quando cansou de brincar de casinha, deixou tudo pra lá. Eu, os meninos, a casa, tudo agora lhe parece um empecilho. Sai, vai sempre ver … amigas... e deixa os meninos, ora com Mariana, ora com babá, ora com sua mãe.
- Ah sei! - Jô cruza os braços e enfrenta o marido – E você? O fato de sair também, de viajar o tempo todo e dificilmente fazer um programa em família não conta né.
- Fala sério Jô! As ultimas vezes, eu que sai com os meninos! Você foi em Ouro Preto, porque se viu sem saída.
- Não venha falar por mim! Eu fui, não fui!
- Eu tambem fui.
- Então pronto. Vamos tambem, todos ao sitio.
Carlos a olha impaciente.
- Já disse que não vou. Vou aproveitar o sossego da casa e descansar. É um fato raro nesta casa.
- Ah, quer saber. Faça o que achar melhor. Vou ligar pra minha mãe e ver se quer ir tambem. Aproveite bem seu sossego.
Já no corredor encontra Mariana que vinha do quarto.
- Nossa mãe, dava pra ouvir os gritos do quarto.
- Mas tambem! Carlos está cada dia mais difícil. Homem com crise de idade é fogo! Nada está bom, tudo é errado. - Observa filha. - Vai assim para o sitio?
Mariana se olha surpresa.
- Por que, não esta bom?
Jô desliza o olhar pelo corpo da filha, exposto pelo biquíni preto com detalhes em verde.
- Nem uma saída de praia?
- Calma né mãe. Vou por um vestidinho por cima. Tava justamente indo à lavanderia, pegar aquele verde musgo que gosto.
- Seu pai não vai. E os gêmeos preferem ir no sitio do Mateus. Vamos só nos duas.
Mariana volta da lavanderia, com o vestido no corpo.
- Pra mim tanto faz.
O vestido, semi transparente, deixava ver toda a beleza de seu corpo bem delineado. Joyce a olha um pouco critica.
- Não está meio curto não?
- Mãe! Vamos para um sitio, de carro, e lá, com certeza, andarei o tempo todo somente de biquíni. Mais algo a dizer?
- Sim. Educação é bom e eu gosto!
- E onde fui mal educada? Santa paciência! Você anda implicando com tudo e todos. Dá um tempo!
- Ah, pare de encher e vamos embora. Vai como quiser. Quero apenas um dia de sossego.
Mariana pega bolsa e a segue resmungando.
- Sossego! Até parece.
Só estava indo porque estava morta de saudade de Lisa. Não se viam a uma semana. Assumidamente a evitava. Primeiro, porque já não conseguia manter as mãos longe dela. Estava dando muita bandeira. E segundo, porque ela lhe conhecia bem demais. Logo perceberia que escondia algo.
Na verdade, estava louca para conversar sobre o encontro que tivera com seu pai. Mas - observa a mãe - era um assunto a ser discutido com ela e não Lisa. E ultimamente a mãe estava estranha, muito estranha. Tensa, arredia. Temia que elas tivessem novo conflito. Já há uns dias sentia uma angustia no coração. A certeza que algo muito sério iria acontecer. Algo que mudaria sua vida para sempre.
E sabia que sua mãe estava envolvida.
Balança a cabeça tentando afastar os pensamentos ruins. 'Vai ser um bom dia. Com certeza será um bom dia'.

"Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é possível fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada".

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