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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Capítulo VI

Juliana suspira impaciente. Isso que dava marcar encontro num shopping com Joyce. Volta a olhar o relógio. 'Aff, deve estar olhando vitrines não é possível!'. Olha distraída os corredores quando uma mulher lhe chama a atenção. De onde estava não podia ver-lhe o rosto, mas que corpo! Observa a cintura fina e os quadris delicados. Adorava mulher de vestido. O cabelo loiro caia em camadas pelas costas. O andar era elegante e a postura bem alongada.
'Sossega Ju... você já tem duas belas dores de cabeça em sua vida... mas porra... não sou cega'
Balança a cabeça e sorri para si mesma . Percebe a loira se virar em sua direção e o sorriso desaparece lentamente em seu rosto, dando lugar a uma expressão de surpresa.
- Lisa? - Sussurra baixinho.
A loira caminha tranquilamente em sua direção, olhando as vitrines porque passa. Juliana sente uma grande expectativa a medida que ela se aproxima.
- Ora, ora, veja quem encontro! Não é que é a Lisa!
Lisa se vira surpresa em direção a voz que lhe chama. Observa a morena de óculos e ar irônico que a encara. Um rosto familiar, uma voz única.
- Ju? Juliana?
- My God! Ela não esqueceu de mim! - Levanta-se do banco onde se encontrava e sorrindo aproxima-se de Lisa envolvendo-a num abraço apertado.
- Lisa! Sempre linda e distante Lisa! Como vai, meu bem?
Ainda surpresa Lisa retribui o abraço e mentalmente ri, percebendo como Juliana aproveitava o gesto para tocá-la um pouco mais.
- Vou bem e você? Surpresa encontrá-la depois de tantos anos!
- Pois é menina! Você sumiu de vez!
- Verdade... na verdade fui morar em SP. Mas agora estou de volta a BH.
- Sério! Mas isso é ótimo! Mas venha sentar comigo. Vamos tomar um cafezinho. - Sorri meio de lado a loira. - Em memória dos velhos tempos.
A conversa já rolava a vários minutos quando o celular de Juliana toca. Com um sorriso de desculpas atente a chamada.
- Ei querida. Como? Atrasada! Que novidade. Pode ficar tranquila, reencontrei uma amiga e estamos colocando o papo em dia. Ok, eu espero. Beijos.
Desliga o telefone e retoma o papo com Lisa.
- Mas estou encantada! Quer dizer que conheceu vários países neste ano que passou! Acho que estou sentindo uma pontinha de inveja surgir dentro de mim.
Lisa sorri divertida. Conversar com Juliana sempre fora um prazer. Pena que estava emocionalmente desestruturada, na época que se conheceram.
- Mas e você? Vejo uma aliança em seu dedo.
Ju ergue a mão esquerda lentamente.
- Pois é menina. Casei. Coragem né. E você?
- Me casei também. Mas, infelizmente, ela morreu em um acidente - O olhar de Lisa por um momento se entristece. Mas logo volta o brilho. - Mas foi, com certeza, um momento maravilhoso de minha vida.
- Sinto muito querida! - Juliana estava surpresa. A Lisa que convivera a anos atrás, evitava envolvimentos emocionais, era fria, nada romântica. - Deve ter sido uma mulher muito especial.
- Sim... ela foi. - Lisa a encara – Mas, é sua esposa que vem a seu encontro?
Juliana sorri um pouco sem graça.
- Bom... Bem Lisa, você me conhece. Quer dizer, não mudei muito para a época que me conheceu. Na verdade, meu casamento é aberto. Tanto eu, como minha esposa mantemos … ah você sabe como é.
- Sério Ju! Nossa, acho que não saberia viver assim. - Tenta imaginar Luiza a traindo e não consegue. - Eu não saberia aceitar uma traição.
- Ah, por favor Lisa. Não é um traição. É uma postura de vida que eu escolhi para mim e que, felizmente, é tambem a escolha de minha esposa.
- Hum...ok. Cada um é feliz a sua maneira. Então deixe-me adivinhar. Você veio encontrar … a outra?
Juliana ri divertida.
- Bom querida, realmente vim encontrar uma mulher, mas quanto a ser a outra está errada. Eu que sou a outra na relação.
- E ela não vai chatear de ver você com outra mulher?
- E desde quando alguem controla minha vida? Tá doida? Ela tem é que saber separar as coisas. Afinal, eu aceito o marido dela.
Lisa arregala os olhos.
- Marido? Você é louca Ju? - Ergue a mão meio irônica - Não, não precisa responder. Você sempre foi doidinha. - Lança lhe um olhar conformado. - Mas... casada Ju? E com homem?
- É porque você não viu o monumento Lisa! Ela é, simplesmente, uma deusa de tao linda - E sorri divertida. - Sem falar que a vida se torna mais emocionante quando você vive perigosamente.
- Pode ser Ju. Mas... eu acho um absurdo uma mulher ser hétero – Faz um gesto de aspas com as mãos – E manter um romance lésbico nas costas do marido.
Juliana se torna um pouco pensativa.
- Mas é como disse Lisa. Cada pessoa faz suas escolhas. Se vive bem assim, que viva.
- Ah, duvido que viva bem. Seja sincera. Ela, com certeza, vive o romance com você escondido. O marido nem deve sonhar.
- Pode ser. - Sorri para a loira. -Você continua radical em seus valores hem Lisa! Não esqueça que pessoas podem ter opções, valores diferentes dos seus e serem felizes. No caso dela é ser bi.
- Ser bi... - Balança a cabeça em negativa – Sinceramente não entendo uma pessoa bi. Como ter atração por dois sexos? Acho impossível! Só de pensar em um homem me tocando sinto comichão de nervosa – e brinca se coçando.
Juliana dá uma gargalhada que atrai olhares das mesas vizinhas.
-Você é uma boba, Lisa. Mas vamos ser sinceras. É essa diferença de posturas e opções, que torna a vida mais divertida.
Lisa ergue o copo e com uma cara engraçada faz um brinde.
- Ok...ok... um brinde a diversidade.
Ju ergue o copo acompanhando o brinde.
- Mas... deixe o marido perceber essa diversidade. - E sorri diante do pouco caso da outra.
- Ahh Lisa, nem acho que o casamento dela é tão importante assim. Para mim, ela o leva na barriga. Mas... se acontecer sumo. Longe de brigas conjugais. E com tantas belas mulheres no mundo... e com tanto carinho que tenho para dar... - Lança lhe um olhar sedutor. - Reencontros inesperados... sabe como é... somos vulneráveis.
- Você sempre teve quedinhas por mulheres em geral, Ju – Lisa sorri para a morena. - Nem tente me provocar. Nossa época já passou. E sinceramente, se não me contento com segundo lugar, vê lá se aceito terceiro!
- Ah!! Decepcionei!!
As duas riem em sintonia e continuam a conversar animadas, sem perceber a morena que se aproxima pelo corredor.
Joyce caminha apressada pelo shopping procurando Juliana. Atrasara demais. Para e olha para os lados impaciente. Onde se metera Juliana? Neste momento, vê a amante de frente para ela, a conversar animada com uma loira. Essa era a amiga? Corre os olhos rápidos pela mulher. Parecia bem jovem, apesar desta estar de costas para ela. Passa a mão pelos cabelos negros e alisa rapidamente o terninho azul marinho que usava. Viera direto do Fórum. Já estava quase diante de Juliana, quando esta a nota e se ergue sorrindo. As duas trocam dois beijinhos e, com um sorriso, Jô vira-se para a outra mulher à mesa. O sorriso congela em seu rosto.
- Lisa? Lisa?
Lisa estava paralisada. Como assim Joyce? Ainda chocada, percorre com o olhar a bela mulher a sua frente. Vê-la, frente a frente, era muito diferente de vê-la de longe. Joyce continuava linda, no auge de seus 35 anos. Sua beleza estava mais acentuada, a postura mais decidida. Nunca perderia a aura de sensualidade que sempre a acompanhara. Sente uma opressão no peito, uma raiva por saber que ambas eram amantes.
- Olá Joyce. - Tenta controlar a raiva da voz.
Juliana observa as duas surpresa.
- Vocês se conhecem?
As duas desviam, com dificuldade, o olhar para Juliana.
- Sim. - Lisa força um sorriso- Eu e Joyce crescemos juntas.
Respira fundo tentando vencer o sentimento angustiante que trazia no peito. Se propusera, a muito tempo, vencer todos os sentimentos negativos e magoas que ainda tinha por Jô. E era isso que faria.
-Mas que bom vê-la novamente Jô. - Levanta-se e abraça a morena.
Joyce estremece ao sentir os braços de Lisa ao redor de seu corpo. Totalmente sem reação, paralisada pelo choque de encontrar seu antigo amor junto à amante, começa a tremer.
Lisa a solta devagar. Observa Joyce puxar rapidamente uma cadeira e se sentar. Senti-la novamente nos braços, trouxera sentimentos adormecidos dentro de si. O cheiro de Jô ainda era o mesmo!
Juliana percebe o clima tenso no ar.
- Realmente vocês se conhecem...
Jô a olha meio perdida. Queria muito rever Lisa, mas não desta forma. Não ali. Não na presença de Juliana.
- Sim... eu... mas como vocês... se conhecem?
- Pois é Jô. Vê que coincidência! - Juliana observa sua reações. - Conheci Lisa na época de faculdade. Uma época deliciosa. - Sorri com falsa inocência - Mas... - Põe o cotovelo sobre a mesa e apoia o queixo na mão - Nunca me disse que tinha uma amiga lésbica.
Surpresa Lisa encara Juliana. Não esperava que abordasse o assunto desta forma.
Joyce reage negativamente a abordagem.
- E porque falaria? Lisa escolheu o caminho dela e eu o meu. Exatamente por estas escolhas tomamos rumos diferentes e nossa amizade se perdeu pelo caminho. - Cautelosa olha a loira – Mas espero de coração podermos mudar tudo isso e … voltar a nossa amizade novamente.
Lisa , incomodada com a situação presente, movimenta-se intimidada na cadeira.
- Jô.. eu... claro que vamos retomar nossa amizade... Bom... eu...tenho que ir.
Juliana a segura pelo braço.
- Que isso, Lisa. Porque a pressa de repente? Eu estou encantada de ver o reencontro de vocês. E surpresa com a coincidência. - Vira-se para Joyce, sentindo uma vontade imensa de provocá-la - Sabe Jô, a pouco falava de você a Lisa.
- Fa... falava? - A olha aflita.
- Sim. - E aguarda a pergunta que Jô não conseguiu calar.
- Sobre... sobre o que?
Juliana sorri maliciosa.
- Sobre como é maravilhoso tê-la em minha vida. – Volta o olhar à loira - Lisa, agora que me apercebi menina! - E faz um ar de falso espanto.
- O que Ju? - Lisa pergunta, pressentindo que iria se arrepender de ter perguntado.
- Cá estou eu, em um shopping lotado de gente, sentada a mesa com minha atual amante e minha ex. Não é emocionante?
Joyce abre e fecha a boca sem que nenhum som saia dela. Como assim atual e ex? E como ela ousa expor sua intimidade assim?
- Juliana ! - Lisa a olha repreendedora.
- Oi Lisa! - E lhe lança um olhar de candura. Depois ergue as mãos num pedido de desculpas. - Ok, desculpe meninas... sabem que adoro provocar. Joyce, desculpe se deduzi errado, por achar que Lisa soubesse de sua... bissexualidade.
- Eu... não vou ficar aqui – Joyce se ergue nervosa.
- Que isso Jô...já pedi desculpas! Lisa, diga a ela que tudo está bem.
Lisa observa o nervosismo de Joyce. Ela sempre detestara ser exposta diante das pessoas. Estava impressionada que tivesse se envolvido logo com Juliana, que não se importava com opiniões alheias e que era totalmente despojada diante da vida.
- Jô.. senta. Está tudo bem. Eu... tenho mesmo que sair. Vou encontrar minha mãe. Eu... adorei vê-la.
Levanta-se da mesa e com um sorriso de censura a Juliana despede-se, afastando sem olhar para trás. Juliana, um pouco sem graça com a brincadeira de mal gosto, dá um sorriso a Jô.
- Jô...
Mas esta nem a olhava. Acompanhava com um olhar saudoso e angustiado a loira.
- Jô?
Finalmente esta percebe sua chamada. A raiva se faz presente em seu semblante.
- Qual era sua intenção? O que ganhou com isso, Ju? Que merda ganhou com sua atitude?
Juliana se surpreende com o tom de voz de Jô, mas antes que possa responder, esta continua.
- Você sabe quanto tempo não vejo Lisa? Sabe quantas merdas tenho que corrigir, quantas vezes esperei poder estar com ela, sem conflitos, apenas para conversar?
Juliana tenta novamente falar, sendo calada pela mão de Jô que, em riste, faz num sinal de pare.
- Sabe quantas vezes desejei reatar a amizade que destruí pela minha intransigência, minha falta de visão? Será que você percebeu a situação terrível que me expôs? - Nessa hora a voz de Jô se elevou.
- Jô, fala mais baixo e se controla. Eu vi que pisei na bola, ok. Não precisa gritar.
Tenta segurar a mão da morena, mas esta a afasta.
- Não me diga que isso vai trazer conflito entre nós! Me poupe Jô. Estou aqui porque você pediu este encontro. Tivemos a felicidade de reencontrar uma amiga em comum. Não transforme isso num campo de batalha.
- Você transformou com sua falta de senso Juliana!!
- Por que tanto blablá com isso? Você não sabe onde ela mora? Depois vai lá, conversa com ela. Quem foi inconveniente fui eu, não você.
- Chega Ju! Não me irrite mais.
Juliana a encara mais séria. Joyce estava pálida, muito pálida. Nervosa, mexia a perna em um ritmo enervante. Divaga a mente ao passado e devagar balança a cabeça numa compreensão súbita.
'Juliana, você meteu os pés pelas mãos...'
- Jô... peço mesmo desculpas. Eu errei. Olha, depois vou procurar Lisa e me desculpar também.
Jô passa as mãos pelos cabelos tensa.
-Tudo bem, eu... também depois vou procurá-la.
Respira fundo várias vezes e a olha. Coloca ambas as mãos sobre a mesa e, tentando esquecer os últimos minutos e controlar a ânsia de correr atrás de Lisa, respira fundo.
- Ju, o caso é o seguinte. Eu tenho quase certeza que Mariana nos viu no bar aquele dia.
- Mariana...bar? Tem certeza? Não é possível Jô! Eu a observei bem! Não tinha como ela nos ver!
- Mas viu! Tenho certeza que viu! Ela veio com um papo que viu alguem parecido, mas a conheço Ju! Ela nos viu!
- Meu Deus! - E passa a mão sobre o rosto.
- Que faço Juliana? Que vamos fazer?
- Pra começar me deixe respirar. Ok...Ok... ela em nenhum momento te afrontou?
Joyce faz um gesto impaciente.
- Eu já disse que não!
- Calma Jô! Estou tentando ordenar meus pensamentos! Se ela não te afrontou, é porque prefere ignorar o que viu, certo?
- Ju! Mariana não é pessoa de ignorar nada! Ela uma hora vai estourar. Presta atenção no que digo!
- O que disse quando ela comentou com você?
- Disse que estava enganada, que não podia ser eu. Que estava na casa de amigas.
- Ótimo. Você vai manter isso. Mesmo que ela te prense contra a parede, vai manter isso.
Jô, impaciente passa a mão pelos cabelos.
- Você não esta entendendo. Mariana não é boba. Não vai deixar passar. Vai ser um inferno.
- Querida, pare de passar as mãos nesse cabelo.
- Droga Juliana! Que se dane os cabelos! - Olha outra revoltada. - Hã... estão muito bagunçados?
Rindo Juliana os arruma para ela.
- Pronto. Agora estão lindos.
- Juliana... eu e Mariana vivemos em conflito. Eu amo demais minha filha, mas … parece que nada que faço para ela é certo. Qualquer coisa é motivo para uma discussão entre nós. E ela com sua... postura tão na dela me irrita. Queria que falasse comigo, confiasse mais. Será que percebe? Por mais que eu negue a presença naquele bar, ela sabe! E isso vai minar o resto de confiança que eu tinha dela.
- Jô... você está aumentando demais as coisas.
- Juliana!! Pára! Eu sinto isso! Eu sei! - Novamente angustiada, passa as mãos nos cabelos.
- Ai Jô... nem sei o que dizer... na sua situação você … Será que não vale a pena conversar com ela, abrir o jogo? Às vezes você pode se surpreender com sua filha.
- Tá louca!! Ela nunca vai aceitar!
- E porque não!? Ela não aceita a Lisa!? - A olha indagadora. - Ela conhece Lisa, né.
- Sim...conhece sim... - Suspira – Ela a conhece. Mas é diferente Ju. Ela... Lisa... sempre assumiu sua opção. Sempre foi...
- Autentica?
Joyce a olha indignada.
- Está dizendo que não sou autentica?
Ju ergue as mãos em sentido de paz.
- Só fiz um comentário.
- Sei... Olha Ju, para Mari, que cresceu vendo Lisa assumir que gosta de mulher, é uma coisa. Agora, descobrir que a mãe, casada, mãe de três filhos, trai o marido e ainda por isso com uma mulher é bem diferente.
- Uau... colocado assim é bem pesado mesmo. - E ri divertida.
- Juliana, não é para rir. - Jô a encara nervosa.
- Eu sei Jô...eu sei – meneia a cabeça – Mas sua situação colocada em palavras foi … bom... foi, foi...
- Absurda, revoltante, sem limites.
- Eu ia dizer outra coisa , mas serve isso.
- Ju!
- Olha Jô, temos que tentar amenizar a situação. Se você não vê possibilidade de conversar com sua filha, então é melhor negar sempre e aguentar as consequências.
- Grande valia sua opinião. - Jô emburrada, cruza os braços.
- Jô! Você quer que eu diga mais o que! Que se separe? Assuma que gosta de estar com mulher?
Joyce a olha assustada.
- Mas eu não quero isso! Nunca disse isso!
- Nossa senhora! Então quer dar um fim no nosso relacionamento?
- Não! Que droga, Ju. Quero as coisas como eram antes, só isso.
- Bom Jô, pelo que me disse, isso é impossível. Então nos resta , ou agir com mais cautela em nossos encontros, ou nos afastarmos.
- Não quero que nos afastemos. Eu... vou agir como se... Que não era eu e pronto.
- Tudo bem Jô... faça isso. - Segura-lhe a mão – tudo vai ficar bem querida. Estou com você nessa.

Lisa, por trás de uma vitrine, observa as duas mulheres. Joyce parecia agitada, nervosa. Gesticulava muito, mostrando grande tensão. Como Jô era bonita! Desliza o olhar sobre a figura feminina. Tao curvilínea, sedutora. Volta o olhar a Juliana. Tambem muito bonita, mas sem fazer concorrência à de Jô. Esfrega a testa. Apesar de todo o constrangimento da situação, sentira uma quentura em poder novamente olhar os belos olhos negros.
'Droga, como Jô pudera arrumar uma amante. E mulher! E Juliana!' Volta o olhar novamente a Joyce. Sempre fora impulsiva, egoísta. Como podia fazer isso com a família dela? Os filhos? Mariana... a mente se volta para a filha de Jô...
As duas se pareciam. Observa-a mais atentamente, agora numa comparação com Mariana. Sim, elas se pareciam. Os cabelos, o tipo de corpo... curvilíneo sensual... a postura mais arrogante. Mas ao mesmo tempo, eram diferentes. O rosto de Mari tinha traços mais suaves, harmoniosos, a expressão muito mais franca. O queixo era mais marcado, quadrado, lhe dando um ar mais determinado. E o olhar... como esquecer o olhar de Mariana? Era um olhar profundo, marcante, acentuado pelos olhos verdes enigmáticos. 

 Já Joyce, tinha olhos negros e voluptuosos. Tudo nela era um convite ao prazer. 'Um prazer usufruído por Juliana! Raiva!'
Lisa segura a cabeça entre as mãos. Que confusão, que angustia! A poucos dias, gritava com Mari pelos sentimentos que ela lhe despertava. Agora, tremia pelo reencontro com Jô, recordava seus momentos com ela, inconformada por vê-la buscar o prazer nos braços de outra mulher.
Percebe Juliana segurar a mão de Jô e esta colocar a sua por cima. 'Não quero mais ver isso!'
Retoma o caminho e, de repente, sai em correria pelos corredores do shopping. O rosto transtornado, desperta interesse nas pessoas que passam por ela.
Lisa tentava fugir de seus conflitos, seus medos, suas indecisões... seus sentimentos. A vida lhe cobrava muito, sempre lhe trazendo dor e sofrimento.
'Por que? Por que meu Deus? Por que não me deixa ser feliz?'

...estou procurando, estou procurando. Estou tentando me entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda.
Clarice Lispector

3 comentários:

  1. Eu sabia que a mari ia sair um pouco de cena haha
    Acho que mesmo a Lisa sentindo essas coisas pela Joyce, ela deveria canalizar isto em uma amizade, ja que ela também sente coisas pela MAriana, e ela tem que parar de comparar a Mari com a Joyce um pouco, que teimosia da Lisa hahaha
    Muito bom o conto como sempre. Parabéns Mistery.

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